A edição de ontem do jornal italiano La Repubblica trouxe uma entrevista com Edward St. Aubyn, o autor dos romances da saga Patrick Melrose. Ele contou que já viu três episódios da minissérie e foi generoso ao elogiar a adaptação e o trabalho do Benedict como Patrick. Confiram abaixo a tradução:
A TV me libertou do peso de Melrose
O personagem autobiográfico criado por Edward St Aubyn virou protagonista de uma série de TV. E ele brinca: “Não carregarei o fardo sozinho”. Mas o quê de tão insuportável há no pobre Patrick?
Entrevista por Caterina Bonvicini
A saga dos Melrose de Edward St Aubyn virou uma série de TV pelo Sky Atlantic, que a exibirá em maio na Inglaterra. É uma série narrativa de cinco romances, uma obra de extraordinária beleza, ambientada no mundo da aristocracia inglesa dos dias de hoje que tem como protagonista Patrick Melrose, alter ego do escritor. Abusado pelo pai quando criança, criado por uma mãe frágil e indiferente, Patrick não consegue evitar o caminho da autodestruição, primeiro através das drogas e depois com o álcool e os opioides, acumulando fracasso em cima de fracasso, casamento incluso. Um personagem trágico pelo qual é impossível não se apaixonar, também pelo seu humor sutil, terrificante e inteligente. Neri Pozza está publicando todas as obras de St Aubyn e na próxima semana chegará às livrarias A Clue to the Exit, um romance de 2000, que tem como protagonista Charlie Fairburn, roteirista de sucesso a quem restam apenas seis meses de vida. Entre o humor ferrenho e reflexões seríssimas, Charlie, assim como Patrick, luta “por aquele instante de liberdade que se esconde no coração das coisas”.
Você já viu a série “Melrose”?
Vi somente os três primeiros episódios ainda inacabados. Maravilhosos. A direção de Edward Berger é fantástica. E perante Benedict Cumberbatch, que interpreta Patrick, ou de Jennifer Jason Leigh, que faz Eleanor, a mãe, compreendi a profundidade do talento.
Você contribuiu com o roteiro?
Estive envolvido, mas não é meu ofício, é o ofício do David Nicholls. Ele me deu o texto e eu fiz as minhas anotações. Mas o roteiro é só uma parte. Tem a direção, tem os atores, tem a cinematografia. Além disso, as piadas mudam durante as filmagens. Tudo isso é fascinante. É bem diferente da escrita.
Respeitou a elegância e o humor dos romances?
Totalmente. Tiveram muitos diálogos originais. Há a mesma empatia para com os personagens, a mesma natureza trágica. Ademais, claro, quando um livro vira filme ou série, toda uma parte da escrita é perdida. A vida interior dos personagens, por exemplo. Por isso, é preciso expressá-la de outra forma, através da atuação ou do ambiente. David fez um trabalho extraordinário de adaptação.
A série dos Melrose é um trabalho de vinte anos. O que você sente ao vê-la como uma série de TV?
Foi interessante principalmente participar das gravações, fiz até uma pequena participação a la Hitchcock. Para mim, foi como tirar férias. Fiquei conversando com os atores, os ajudando. Foi muito bom estar perto de outras pessoas. Eu estou sempre sozinho. Fora isso, minha profissão é solitária.
A série dos Melrose é semi autobiográfica e há alguns anos você me disse que, para escrever sobre si mesmo, é necessário usar a terceira pessoa. Mas isso é muito mais do que uma narrativa em terceira pessoa: há um ator que está encenando o seu passado.
Com certeza. Para mim, foi uma sublimação dupla. É emocionante ver que a história se transforma numa coisa sobre a qual você não tem mais controle, uma coisa que se afasta de você. Foi um alívio enorme! (Risos). Patrick Melrose carrega o peso de uma parte da minha vida. Muito generosamente, Cumberbatch se transformou no Patrick e as pessoas pensarão que é ele o Patrick, não eu. Quem não leu os livros e vai ver a série associará Patrick ao ator, não a mim. É uma sensação agradável. Eu continuava arrastando essa bagagem pesada, e então alguém chegou e me ajudou a carregá-la.
Em “A Clue to the Exit”, o livro que está sendo publicado agora na Italia, aparecem semelhanças entre Charlie, o protagonista, e Patrick. Ambos tem uma inclinação forte para a autodestruição e, ao mesmo tempo, um forte desejo de liberdade.
Tem razão. Nunca havia pensando nessas semelhanças. Mas o nível de envolvimento é diferente se você usa a primeira ou a terceira pessoa. Em terceira pessoa é maior do que em primeira. Em primeira pessoa, tudo é mais explícito e urgente e implacável. Patrick, contado em terceira pessoa, muda lentamente e dolorosamente com o tempo. Charlie, que é contado em primeira pessoa, é guiado pela sua urgência. Mas é verdade: se assemelham na combinação entre enorme seriedade e capacidade para autodestruição. Ambos buscam a liberdade. Mas Patrick busca se libertar de um incidente pessoal, histórico, que compartilha com seus leitores. Já Charlie persegue a liberdade como uma presa a ser caçada.
Mas você sente falta de Patrick ou a série mudou definitivamente seu relacionamento com ele? Por que muitos gostariam de ler outro livro sobre os Melrose…
Bom, você precisa me dar um tapinha nas costas se quiser outro livro sobre Patrick. Nunca me senti no dever de continuar. Mas não sou confiável. Toda vez digo ”agora vou parar” e depois escrevo outro. E vice-versa.
A minissérie
Benedict Cumberbatch é Patrick Melrose nessa minissérie produzida pelo Sky Atlantic que estreará no Reino Unido no dia 13 de maio. Melrose é composta de cinco episódios, um para cada livro da saga de Edward St. Aubyn. Na Itália, Neri Pozza publicou em um único volume os quatro primeiros romances em 2013, enquanto que o último, Enfim, foi publicado à parte. Entre os outros protagonistas da série está Jennifer Jason Leigh no papel de Eleanor, mãe do protagonista.
Tradução: Gi