Benedict entrevistou por telefone seu amigo e ator Tom Hiddleston para a edição de outubro da revista Interview, enquanto Tom estava filmando na Austrália. Confira a tradução!
Que época para estar vivo — especialmente se você calha de ser um Tom Hiddleston, aluno graduado da prestigiosa Drama School, da Eton College, Cambridge, e da Royal Academy of Dramatic Art; aquele Tom Hiddleston — astro do palco e da tela, recentemente afastado de um romance com a garota megawatt dos sonhos Taylor Swift.
Para Hiddleston, a vida é tão boa que vem com algumas teorias da conspiração boas-demais-para-serem-verdade — a melhor das quais diz algo do tipo, Hiddleston, aos 35, é o principal candidato a substituir Daniel Craig como o próximo James Bons, e equipes de PR encenaram o relacionamento dele com Swift para elevar seu poder de astro. Como se ele precisasse da ajuda.
A estrela de Hiddleston esteve, por sua própria vontade, e energizada por seus talentos abundantes, em ascensão perpétua desde que foi escalado como o mitológico vilão Loki, um personagem recorrente no Marvelverso de filmes em andamento, no Thor de Kenneth Branagh (2011). Cinéfilos podem provavelmente se lembrar do ator mais afetuosamente como o vampiro de centenas de anos/roqueiro em Amantes Eternos, de Jim Jarmusch (2014) em frente a Tilda Swinton. Mas olheiros teriam percebido o trabalho de Hiddleston muito antes, em uma variedade de papéis teatrais e da televisão — ao lado de Branagh em Wallander da BBC, por exemplo — plataformas onde ele continuou a crescer, todo o caminho para cima e incluindo The Night Manager, de John le Carré, a minissérie deste ano adaptada de Susanne Bier, no qual Hiddleston estrelou como um agente de campo, espionando o traficante de armas mais sinistro do mundo.
No ano que vem, na força de dois blockbusters do tamanho de um monstro (Thor: Ragnarok e Kong: A Ilha da Caveira) — e, talvez, tá bom, aquele relacionamento muito falado — a estrela de Hiddleston provavelmente se estabelecerá lá no firmamento superior onde as estrelas da lista A vivem. Quer essa ascensão o trará ou não a Bond ou além, a intriga provavelmente o seguirá aonde quer que ele for. Em agosto, enquanto filmava na profundeza mais profunda da Austrália, Hiddleston foi ao telefone com seu amigo e colega da Marvel Benedict Cumberbatch para conversar sobre os perigos e poder potencial que vem junto com o olhar público.
BENEDICT CUMBERBATCH: Como todos os entrevistadores, eu deveria em primeiro lugar agradecer a você, Tom, por ter este tempo.
TOM HIDDLESTON: [risos] Obrigado, Benedict. Nós deveríamos agradecer um ao outro por nosso tempo. Pelo resto de nossas vidas.
CUMBERBATCH: E então, no típico costume britânico, deveríamos pedir desculpas por tudo também.
HIDDLESTON: Lamento por perturbar você.
CUMBERBATCH: Lamento mais do que você.
HIDDLESTON: [risos] Como você se sente quanto a…
CUMBERBATCH: Meu papel como jornalista?
HIDDLESTON: Me sinto em conflito. [risos]
CUMBERBATCH: Eu sinto que meu papel aqui é muito mais como um amigo de verdade do que um jornalista. Não haverá bolas curvas, eu prometo. Mas só para começarmos como é colocar o cabelo e chifres, trabalhar com Chris [Hemsworth] novamente, e trabalhar na Austrália com Taika [Waititi], seu diretor?
HIDDLESTON: Bem, é muito excitante porque eu não interpretei o Loki por quatro anos. A última vez em que usei o figurino foi na San Diego Comic-Con em 2013.
CUMBERBATCH: Você tá brincando!
HIDDLESTON: A melhor coisa sobre isso, honestamente, é trabalhar com Chris de novo. Eu o encontrei pela primeira vez na casa de Kenneth Branagh na Inglaterra em 2009. Nos éramos meras crianças, no começo de nossas jornadas na atuação. Fizemos uma conexão instantânea, e tem sido extraordinário compartilhar esta viagem com ele — esta jornada louca com a Marvel. Anthony Hopkins esteve no set esta semana. E Taika Waititi é magnífico. Ele achou uma maneira de honrar tudo que veio antes mas fazendo a coisa própria dele. E ele é tão engraçado. Os filmes dele — e se não o fez, deve procurá-los: O Que Fazemos Nas Sombras, Hunt for the Wilderpeople — eles têm essa combinação de alegre, bom humor e emoção. São muito comoventes. Todo mundo está muito feliz. E claro, só estamos no começo.
CUMBERBATCH: Quantas semanas mais você ainda tem que trabalhar?
HIDDLESTON: Eu estarei aqui até o começo de novembro.
CUMBERBATCH: Saquei, você ainda tem um longo caminho. Então você está tendo um inverno australiano, que eu imagino que é adorável para caramba comparado a um inverno inglês.
HIDDLESTON: [risos] É o que eles vivem dizendo. Nós estamos na costa de Queensland, e tirando o fato de que o sol se põe muito cedo e muito rápido, tem sido céus azuis e brilho do sol. É preferível para minha pele céltica ao verão deles. Eu estava aqui exatamente no mesmo lugar em janeiro fazendo Kong: A Ilha da Caveira que foi adorável mas incrivelmente quente.
CUMBERBATCH: É uma boa transição sem pausa. Vamos falar sobre isso, desde que essa foi sua última excursão. Você teve condições muito severas — acho que foi Vietnã onde você estava filmando na selva, e depois um verão australiano muito quente.
HIDDLESTON: Vietnã foi inacreditável. Eu me sinto tão sortudo de ter ido com aquela produção, ser parte do circo ambulante de um filme grande assim… Nós gravamos em Oahu, Havaí. Gravamos na Austrália. E gravamos no norte do Vietnã, em e à volta de Hanoi, Ha Long e Ninh Binh. E eu acho que o que é empolgante nisso é que existe paisagem no Vietnã que muito poucas pessoas já viram. E as pessoas que conheci no Vietnã estavam extremamente empolgadas. Do minuto em que cheguei — Jordan Vogt-Roberts, o diretor, Brie [Larson], Sam Jackson, Alex Garcia [o produtor executivo] e eu demos uma coletiva de imprensa em Hanoi que foi apresentado pelo embaixador americano no Vietnã. Foi um momento muito grande para o país. Muitas pessoas que nós conhecemos nunca tinham visto produção nessa escala. Em certos lugares, nós ajudamos a construir estradas para que pudéssemos levar o equipamento de câmera em caminhões quatro por quatro de e para onde precisávamos ir. No primeiro dia, Sam apareceu para uma cena muito simples com muito pouco diálogo, e havia milhares de pessoas que apareceram para assistir. E então depois de uma hora eles ficaram entediados e nós dissemos, “Oh, isso não é muito emocionante. Vamos voltar para o que estávamos fazendo”. Mas, para todos nós, estávamos expostos a este país extraordinário de beleza de tirar o fôlego.
CUMBERBATCH: Oh, eu não vou ter que escrever isso, vou?
HIDDLESTON: Você vai transcrever isso mais tarde?
CUMBERBATCH: Eu estou meio que olhando para uma paisagem muito europeia imaginando o que você está descrevendo, muito longe de caneta e papel. Sinto como se estivesse nas selvas do Vietnã. Mas contanto que outra pessoa tenha essa ortografia e essa não for minha responsabilidade editorial, eu ficarei muito feliz. Bem, Tom, você é um escritor e ator igualmente eloquente. Eu me lembro de ler um artigo que você escreveu, descrevendo o primeiro dia encarando este ícone do cinema, King Kong. Sabe, você tem uma grande reputação como cineasta. Mas eu estava me perguntando se houve uma era de cinema — se você tivesse uma máquina do tempo — para o qual você pudesse voltar e da qual fazer parte? Quer sejam musicais, neorrealismo na Itália pós Segunda Guerra Mundial ou talvez um filme do Spielberg nos anos 80?
HIDDLESTON: Existem duas ótimas eras que eu ainda venero. Ainda fico impressionado em reverência e admiração com as tomadas ininterruptas da dança de Fred Astaire e Ginger Rogers e Gene Kelly. Não há nenhum “Nós vamos arrumar isso no pós”. Eu estava assistindo a um clipe de Ritmo Louco [1936] e… Qual é o nome dele em Cantando na Chuva [1952]? “Make ‘Em Laugh”? Donald O’Connor! Eu assisto a esses filmes em reverência. Era um tipo diferente de performance. E a segunda é os anos 70.
CUMBERBATCH: Quando os garotos da Costa Leste tomaram conta de L.A. e do sistema de estúdio? Os Scorceses…?
HIDDLESTON: Sim. A urgência emocional e o realismo e a seriedade do cinema de então. Taxi Driver – Motorista de Taxi [1976], Touro Indomável [1980], Apocalypse Now [1979] …
CUMBERBATCH: Eu concordo totalmente. Eles eram grandemente relevantes, abordando assuntos enormes e importantes da época deles politicamente. Eles conseguiram encontrar o equilíbrio dourado entre entretenimento e arte.
HIDDLESTON: Também foi quando Stanley Kubrick estava fazendo seu melhor trabalho. 2001 – Uma Odisseia no Espaço saiu em 1968. Antes do pouso na lua em 69, eles sentiam que já tinham estado lá por causa do que Kubrick havia dado a eles como experiência no cinema. Nas verdade eles inventaram materiais com a NASA, trajes e adereços, para ter coisas que estavam à frente de seu tempo. Quero dizer, é sci-fi dirigindo o barco. E os filmes que estamos fazendo agora ainda são informados por esses filmes, por aquela era extraordinária. Embora, sejamos culpados pelo pensamento da era dourada — uma ideia de Meia-Noite em Paris.
CUMBERBATCH: Ao mesmo tempo, nós reconhecemos que, nos últimos dez anos, estivemos vivendo em uma era dourada da TV de forma longa, da qual você faz parte agora. Quando The Night Manager estreou no Reino Unido, você não conseguia se mover para as pessoas falando sobre isso. Foi totalmente fascinante, e outra ótima joia na coroa da BBC. Como foi isso, trabalhar com Susanne Bier?
HIDDLESTON: Eu adorei a experiência de fazer isso. Sempre pareceu como se estivéssemos fazendo um filme de seis horas. Nós fizemos o storyboard e o programamos como um roteiro de 360 páginas, com uma diretora. Susanne era nossa capitã. Nós gravamos na Suíça, Londres, Devon, Marrocos e Maiorca, nessa ordem. Pareceu que a parte do leão na série aconteceu no Marrocos, em Marrakesh, onde estavam nossos interiores do Cairo, e onde gravamos os protestos da Primavera Árabe. Nós passamos sete semanas em Marrakesh e tivemos que passar por tantas páginas por dia, nas quais eu estava incluído em todo quadro — eu era Jonathan Pine e Andrew Birch e Thomas Quince e Jack Linden. Alguém me perguntou recentemente como era voltar para a televisão, e não pareceu isso. A diferença é maior para o público do que é para nós, eu acho. E, curiosamente, falando nos anos 70, The Night Manager foi opcionado pela primeira vez por Sydney Pollack [no começo dos anos 90], e ele comissionou um roteiro de filme de Robert Towne. Finalmente os direitos voltaram para le Carré e seus filhos Simon e Stephen Cornwell. Mas talvez haja um mundo onde essa história é melhor por em horas do que em duas. Eu não sei. Como você se sente? Você é alguém que, por muitos, muitos anos, fez simultaneamente televisão e cinema. Nós estávamos cavalgando cavalos no dia depois que o primeiro episódio de Sherlock foi ao ar na BBC — você estava caindo dos cavalos, treinando para Cavalo de Guerra [2011]. Eu lembro quando Sherlock se tornou o fenômeno extraordinário que se tornou. E desde então, vocês fez três temporadas?
CUMBERBATCH: Nós fizemos quatro temporadas. E um especial de Natal…
HIDDLESTON: E 12 Anos de Escravidão [2013] e O Jogo da Imitação [2014] e um milhão de outras coisas nas quais eu não estou pensando. Isso não para.
CUMBERBATCH: Eu estou, agradecidamente, parando agora e tenho tempo para falar com você, meu amigo, o que é muito legal, embora nossas palavras estejam sendo gravadas e impressas. Nós deveríamos ter uma conversa quando desligarmos. Me desculpe por isso, mas algumas coisas estão fora dos limites. Eu sinto que a TV e o cinema alimentam bem um ao outro. Está mais na percepção do espectador do que está na do ator. Existem exigências específicas, porém, na televisão, e você percebe as constrições de orçamento. É a restrição de tempo e uma restrição de dinheiro mais do que qualquer outra coisa que você percebe. Mas a ambição da escrita e, tomara, a entrega dela fica cada vez melhor porque queremos nos exceder para se manter à frente de um público expectante e faminto.
HIDDLESTON: O que você acha de revisitar um personagem — como Sherlock ou Loki — ao invés de inventar um personagem pela primeira vez?
CUMBERBATCH: Acho que você tem que abordá-lo no mesmo nível da invenção. Há coisas que são um dado, que você já estabeleceu, e obviamente, visualmente, certas coisas icônicas que não podem ser completamente removidas, como um certo chapéu e um certo casaco no meu caso. Eu sei que você lutou com os chifres, e eu queria falar com você sobre isso se você pudesse falar sobre isso. Isso morre quando você não sente a reinvenção. É interessante. Eu gosto verdadeiramente disso. Acho que não faria isso se a escrita não fosse tão boa, se não me pedissem para fazer coisas diferentes com o personagem. Isso depende mesmo de quais são os obstáculos e os objetivos. Se são interessantes, então você pode trazer novas táticas ao jogo. E eu acho que os personagens deveriam ser um livro aberto, uma tela branca. Com o Loki, o deus da injúria que muda de forma pode ser um número de coisas. E um detetive consultor que de repente pode lutar kung fu e falar uma língua diferente ou falar na linguagem de sinais… Existem todos esses recursos inexplorados. No que diz respeito a ir para um dia de trabalho, eu gosto da familiaridade disso. Eu me pergunto se seria o mesmo revisitar um papel clássico no palco. Tipo, se eu fosse fazer Hamlet novamente em outro lugar, como seria? Porque são as mesmas frases, aqueles são os mesmos predicamentos, os mesmos personagens com os quais você está brincando. Nada mudou; foi o contexto que mudou. Você tem uma dimensão espiritual na sua via diária? Se você está tendo problemas em um dia, você tem uma rotina? Um mantra ou algo assim?
HIDDLESTON: Você tem que fazer alguma coisa, mesmo que seja para começar o dia com um pontapé inicial. Eu uso música. E corrida. Eu acho que, quando estou trabalhando, se eu começo o dia com uma corrida — externa, não em uma academia, mas apenas eu lá fora nos elementos, com apenas minhas próprias pernas para me impulsionar para frente… Tem alguma coisa a ver com estar no mundo e sair da minha própria mente.
CUMBERBATCH: Você está disciplinado quanto a sair da cama assim como acordar cedo para fazer esse exercício?
HIDDLESTON: Você tem que estar. Não consegue funcionar. E varia de trabalho para trabalho. Em Kong: A Ilha da Caveira, nós sempre estávamos do lado de fora. Meu personagem era um ex-perseguidor da SAS, então ele é meio que um último atleta — eu sempre conseguia, tipo, correr e fazer meu sangue correr se eu estivesse me sentindo preguiçoso.
CUMBERBATCH: Eu li Hugh Laurie louvando você aos céus, dizendo que sua energia manteve toda a unidade funcionando às vezes. Mas você já teve problemas com maquiagem e figurino? Eu me lembro de ver fotos suas correndo com Chris em algum momento na Islândia. E, droga, é somente por causa daquele sorriso inglês e charme que você tem, que deixariam você fugir do assassinato que você normalmente deve comprar de seus maquiadores e seu figurista.
HIDDLESTON: [risos] Eu não sei, não é pra todo mundo. É simplesmente o jeito que eu faço. E a coisa com correr é que, se eu corro pela manhã antes do trabalho, eu me sinto como se estivesse à frente do dia. Qualquer trabalho que eu tenha feito em termos de preparação ou pesquisa ou reflexão sobre a cena ou o personagem, tudo meio que cristaliza naquele momento pela manhã. E ás vezes eu tenho as melhores ideias naquele momento. Eu me lembro quando estava fazendo “Henrique IV Parte 1” para The Hollow Crown – uma série que você também estrelou, brilhantemente – nós tínhamos muito pouco tempo, e nós estávamos prontos para filmar essa cena central entre Henrique IV e o Príncipe Hal, onde Hal é chamado na corte do pai e é publicamente reprimido e humilhado por estar fora com Fastaff. É extremamente uma via de mão dupla entre os dois atores. E Rei Henrique IV tem a maioria das falas – nesse caso Jeremy Irons. E eu lembro de pensar depois de uma certa fala que ele deveria me bater. Isso era janeiro de 2012, e foi na minha corrida pela neve ás 5 da manhã que eu tive essa ideia – que ele deveria simplesmente me dar um tapa na cara. E esse é literalmente o momento que Hal acorda e se dá conta do peso de sua responsabilidade como futuro rei. Todo o peso da poesia e das palavras de Shakespeare. Mas vem com um tapa.
CUMBERBATCH: É um grande momento. Mas é a mesma coisa, eu acho, se é respirando ou meditando ou yoga. E correr é uma ótima maneira de fazer isso. Há algo tão móvel sobre você. Não somente fisicamente, não a corrida, mas você está muito atento ao que está na sua frente. Você tem medo de alguma coisa vir a ficar no caminho disso? Eu quero dizer, é como perguntar alguém aparentemente invencível o que ele mais teme. Não se sinta obrigado a responder. Me mande a puta que pariu se você quiser. Você pode, porque eu sou seu amigo.
HIDDLESTON: Obrigado, amigo.
CUMBERBATCH: Posso te dizer o meu enquanto você pensa na sua resposta?
HIDDLESTON: Me diz o seu e vou te dizer o meu.
CUMBERBATCH: O tempo passar. E isso é puramente por ter me tornado um pai, querendo ter um pouco mais disso a cada dia, ter algo fora de mim que é mais importante do que eu para me focar. Isso foi um despertar brutal, o minuto que ele nasceu. E toda vez que eu seguro ele, olhar para algo tão novo e olhar para este eu de 40 anos de idade no espelho e pensar, “Uau, eu realmente quero estar por perto para ver seus filhos.”
HIDDLESTON: O meu é parecido. O meu é arrependimento. Eu temo olhar para trás e desejar ter feito coisas que eu não fiz. É interessante, eu li esse artigo extraordinário sobre um livro, muitos anos atrás, de uma enfermeira australiana especialista em cuidado paliativo. Era o trabalho dela ajudar as pessoas no fim, aliviar a dor. Então ela passou muito tempo com pessoas em seus últimos dias e semanas. E ela se sentiu tão emocionada pela experiência acumulada, porque ela ouvia as pessoas falando coisas tão similares. Estranhamente, no topo da lista estava, “Eu queria que eu não tivesse trabalhado tão duro.”
CUMBERBATCH: Isso é bastante grande de ter que enfrentar.
HIDDLESTON: Uma família completamente balanceia esse equilíbrio, mas como você lida com essa realização na sua vida? Você está tentando achar mais tempo agora entre projetos?
CUMBERBATCH: Eu estou fazendo com que tenha mais tempo. E, talvez seja só estar ficando mais velho, mas eu não quero perder as coisas. Nós temos o mais extraordinário privilégio de fazer esse trabalho, mas algumas vezes, estar longe, na locação, eu sinto como se estivesse fora por grande parte da minha própria vida. Eu quero ser melhor em ficar junto.
HIDDLESTON: Os outros cinco arrependimentos escritos pela enfermeira australiana eram: Eu queria não ter trabalhado tão duro; Eu queria que eu tivesse tido a coragem de viver uma vida verdadeira comigo mesmo, não a vida que os outros esperavam de mim; Eu queria que eu tivesse tido a coragem de expressar meus sentimentos; Eu queria que eu tivesse permanecido em contato com meus amigos; e eu queria que eu tivesse me deixado ser mais feliz. É uma lista extraordinária de fazer as coisas de seu próprio jeito, não é?
CUMBERBATCH: Essa é uma lista muito boa para você. Essa é uma lista muito boa para mim. Eu acho que pra qualquer um que trabalha muito e que está frequentemente longe de casa. Eu acho que a estranheza do nosso trabalho, assumir essas circunstâncias imaginárias como outra pessoa em um mundo fictício, que você tem que falar a respeito e narrar em publicidade, isso é uma forma de projeção que não é você inteiro – não poderia ser, ao contrário não restaria nada para o que você voltasse para casa. Mas como você volta a ser aquela pessoa que você é quando você esteve em público? Há algo em particular que te traz de volta a quem é Tom? É a casa? Família? Amigos? Exercícios?
HIDDLESTON: Eu simplesmente vou pra casa. Isso é literal e metafórico. Para Londres. Quando eu terminei The Night Manager, eu percebi que por 75 dias, eu vivi mais horas por dia como Jonathan Pine do que eu passei como eu mesmo.
CUMBERBATCH: Tem um efeito em você, não acha?
HIDDLESTON: Sim. Você está se colocando no lugar de outra pessoa. A melhor coisa que eu poderia ter feito foi exatamente o que eu fiz. Eu voei para casa e eu fui para a festa de noivado da minha irmã. Eu estava rodeado pela família. E eles foram tão tranquilizadores. E depois eu, eu vivo uma vida tão chata, eu simplesmente passo o tempo, leio livros que tinha intenção de ler e não tinha tempo.
CUMBERBATCH: Eu fiquei na sua casa, lembra?
HIDDLESTON: [risos] Sim. Eu só passo o tempo e me atualizo, vou tomar café, e leio o jornal e saio com minha mãe e meu pai.
CUMBERBATCH: Você tem feito um trabalho maravilhoso para a UNICEF. Eu li o que você escreveu sobre sua experiência na missão de averiguação uns dois ou três anos atrás, no Guiné, África – parece que foi uma experiência formativa muito importante pra você. Você acha que existe também a responsabilidade porque agora você tem essa voz pública?
HIDDLESTON: Meu investimento pessoal no personagem Pine foi enorme, e Hugh Laurie, que amava The Night Manager e tem amado por 20 anos, foi no registro, identificando Pine como uma alma perdida procurando por uma causa. E por uma simples reviravolta do destino, uma semana antes de eu começar The Night Manager, eu fui ao Sudão do Sul com a UNICEF para fazer um documentário sobre os efeitos da guerra civil que está acontecendo no país, mesmo agora. O efeito em crianças inocentes. Sudão do Sul é a mais jovem nação do planeta. Declarou independência do Sudão em 2011. E em meados de dezembro de 2013, o presidente e o vice-presidente caíram em um sério desentendimento, e isso dividiu a nação segundo linhas étnicas. Eu fiz um documentário, que ainda não foi lançado, sobre o recrutamento de soldados crianças, que é uma violação dos direitos humanos. E eu vi um país que foi fortemente militarizado, e eu me perguntei de onde aquelas armas tinham vindo? Há tanta pobreza e desespero no Sudão do Sul, e mesmo assim cada lado é equipado militarmente. Como isso aconteceu? E eu voltei de lá tendo testemunhado, em primeira mão, a violência da qual um homem como Richard Roper em The Night Manager tira proveito. E eu me lembro de jantar com John le Carré e contar a ele sobre o Sudão do Sul, sobre quão impotente eu me senti, quão sem esperança é o fato daquela pobre nova nação e seus habitantes estarem sendo dilacerados por uma guerra civil. E então, de certo modo, a raiva moral de Pine pertence a mim também. E le Carré inclinou-se para frente e disse, “Use isso. Use isso.” O mundo que eu cresci está no momento se tornando cada vez mais perturbador e inquietante. Em todo lugar há desigualdade, em todo lugar há divisão e eu me preocupo com isso. Eu acho que todo mundo se preocupa. Eu gostaria que nós pudéssemos ser decentes uns com os outros. E eu pensei muito se eu tenho a responsabilidade de me levantar pelo que eu acredito por eu ter uma plataforma, por eu ter uma voz. Há uma linha vermelha onde você tem que se levantar por essas crianças. Eles não pediram por isso. E, além disso, eu estou profundamente atento a minha falta de habilidade de fazer qualquer diferença material. Eu não sou médico. Eu não posso influenciar a política estrangeira. Eu não posso construir escolas. Eu não posso mexer quimicamente com a pasta de proteína que ajuda as pessoas com má nutrição aguda. Mas eu posso falar sobre isso, e você também pode. Tem um cirurgião extraordinário chamado David Nott, que foi para Aleppo em 2012, antes de estar nas notícias, e tratou crianças e vítimas da guerra na Síria. Foi incrível ouvir de sua bravura, e eu suponho, que como alguém que foi escolhido pela UNICEF para ser embaixador, eu sinto que eu tenho a responsabilidade de me levantar por aquelas crianças. Porque ninguém está se levantando. Então eu faço isso, e é um equilíbrio delicado porque eu sou um ator. E mesmo assim de alguma forma, nos sãos dadas essas plataformas para falar e eu tenho ficado muito inspirado pelas pessoas que tiveram a bravura e coragem de fazer isso muito antes de mim.
CUMBERBATCH: É muito fácil ser cínico sobre qualquer tipo de interferência em coisas que estão além de nossas habilidades, como você disso. Nós não somos voluntários da UNICEF ou equipes em campos de refugiados. Nós não somos policiais ou políticos. Mas, eu acho que, depois de certo envolvimento ou pesquisa ou afiliação com alguma coisa, nós podemos levar o brilho do holofote para as pessoas que fazem esse trabalho, como as pessoas que trabalham para a UNICEF em campo. E isso é fazer uma coisa boa. Eu prefiro muito mais ser criticado por isso do que ficar em silêncio em face de tanto sofrimento, que é dolorosamente óbvio para todos. Quer seja na Síria ou Sudão.
HIDDLESTON: Eu estou muito orgulhoso disso.
CUMBERBATCH: Você deve estar.
HIDDLESTON: Uma vez que você vê certas coisas, o escrúpulo moral te leva a agir. E ter visto o que eu vi no Sudão do Sul, não tem como eu não falar sobre isso. Eu já mencionei isso pra você antes, mas isso me lembra daquele extraordinário discurso no Nobel por Harold Pinter em que ele falou sobre a distinção entre verdade como um dramaturgo e verdade como cidadão. “Verdade em drama é ilusório. Você nunca realmente encontra, mas a procura por ela é compulsiva.” Ele diz, “Ás vezes você sente que tem a verdade do momento na sua mão e depois ela escapa pelos seus dedos e é perdida.” Mas como cidadão, você tem um dever de questionar o que é verdade e o que é falso. Eu me lembro de assistir ele falando isso, me sentindo muito inspirado.
CUMBERBATCH: Eu concordo. Como você poderia negar esse impulso, tendo testemunhado em primeira mão? Eu não posso nem imaginar o efeito que deve ter tido em você. E há o outro peso de nós estarmos sob o olhar do público, que é a presunção de que, por seu trabalho e seu trabalho de promover ser muito público, sua vida privada deve ser, também. E, sem entrar em um grande debate, eu só quero dizer que não vou perguntar sobre a vida pessoal do meu amigo só porque existem fotos não solicitadas dele e de certo alguém, em um relacionamento ou juntos. Eu não vou entrar nisso. Então essa porta está fechada, querido leitor.
HIDDLESTON: [risada] Obrigado.
CUMBERBATCH: De nada. Eu sei que você faria o mesmo por mim. E, de volta a essa responsabilidade de ser uma figura pública, você disse que se sentiu muito grato pelas coisas que vieram com essa responsabilidade, essas experiências extraordinárias. Existem pensamentos particulares sobre experiências na sua infância, adolescência, nos seus vinte anos, e agora nos trinta, pelos quais você é grato?
HIDDLESTON: Eu me sinto muito grato a minha mãe e ao meu pai por uma infância feliz. Existem coisas eu agora entendo que eles foram capazes de me dar que são muito especiais. E eu acho que os primeiros anos, a primeira década de sua vida, é a mais formativa de certo modo. Fora isso, eu sou grato pelas pessoas que acreditaram em mim quando outros não.
CUMBERBATCH: Você tem um mestre de drama ou um contemporâneo que dirigiu você e por quem você é particularmente grato?
HIDDLESTON: Tinha um professor chamado Charles Milne. Eu participei de uma produção de Journey’s End no Festival de Edimburgo em 1999. Eu estava prestes a ir pra Cambridge, e ele escreveu um cartão para mim depois e disse, “Vá para Cambridge e aproveite. Salte para dentro e aproveite o passeio, a experiência. Mas talvez do outro lado, pense sobre ser ator.” E esses momentos quando alguém fortalece sua autoconfiança desse jeito, são muito, muito raros. E eu sou grato a Kenneth Branagh. Ele fez tanto por mim. Em um momento particular na minha vida, ele acreditou em mim de forma muito importante. Eu sempre serei grato a ele por isso. Eu até sinto grato pelas falhas.
CUMBERBATCH: Isso é muito bom! Mas eu acho que você tem se saído tão bem. Eu gostaria de ter visto essa produção de Journey’s End. Acho que você deve ter arrasado.
HIDDLESTON: Eu acho que te vi atuar antes mesmo de você saber quem eu era.
CUMBERBATCH: Quando foi isso?
HIDDLESTON: Hedda Gabler. Como Tesman. Eu me lembro muito bem.
CUMBERBATCH: Oh, meu Deus. Bem, eu te conheci não muito depois disso, eu acho. Porque você estava indo fazer o primeiro filme do Thor, e lembro que teve uma festa. Eu não vou mencionar de quem era a festa, mas de qualquer forma, nós tínhamos acabado de ter um encontro social e eu pensei, “Deus, esse cara está voando!”. Você tinha acabado de terminar Otelo, acho.
HIDDLESTON: Como você se sente se juntando ao universo da Marvel?
CUMBERBATCH: Eu senti como se fosse mais pelo papel do que qualquer outra coisa. Eu estive na Comic-Com, e é uma maneira muito boa de dar algo de volta aos fãs que guiam essas coisas. Foi bastante assustador. Eu me senti como Pink Floyd. É simplesmente tipo, “Olá, oi” e os fãs estão todos gritando. Esse lado é fenomenal, e me faz rir, e eu não sei se eu vou me acostumar com isso. Mal posso esperar para ver como irá expandir o universo. Eu também faço parte da sua equipe! É um elenco incrível de atores. E é o trabalho duro mais divertido que você irá fazer, acho, como um ator. Eles sabem de verdade como te tratar bem. E o material é desafiador, espirituoso, e muito divertido de fazer. Doutor Estranho é um personagem complexo, engraçado, mas emocionante.
HIDDLESTON: Meu amigo, obrigado por fazer isso.
CUMBERBATCH: De modo algum. Se cuide.
HIDDLESTON: E, feliz aniversário!
CUMBERBATCH: Muito obrigado. Eu vou te desejar bons sonhos aí do outro lado do mundo. Te vejo de volta em Londres, então.
Tradução: Aline e Juliana | Fonte