Benedict é capa da edição de 7-13 de maio da revista britânica The Big Issue. Nesta entrevista exclusiva, ele fala sobre Patrick Melrose, SunnyMarch, séries e a importância da gentileza. Confiram abaixo a tradução e o scans da publicação:
“O amor pode vencer… Mas, nossa, como ele luta para chegar lá”
Dinheiro, devassidão e drogas. O novo drama de Benedict Cumberbatch é uma promessa sedutora, mas, como ele conta à Adrian Lobb, aborda um sistema de classes podre.
“Eu fiz muita coisa desde a última vez que nos falamos, né?”
As conquistas recentes de Benedict Cumberbatch são bem impressionantes quando ditas em voz alta.
Salvou (ou potencialmente destruiu) metade do universo como Doutor Estranho no estrondoso sucesso de bilheteria da Marvel, Vingadores: Guerra Infinita; terminou Sherlock – por ora, pelo menos; recebeu uma indicação ao Oscar por O Jogo da Imitação; estrelou uma temporada esgotada de Hamlet no Barbican; recebeu um CBE; apresentou-se no palco com Pink Floyd; casou-se com a diretora de teatro Sophie Hunter e tornou-se pai. E agora ele está interpretando seu personagem mais extremo até hoje – o danificado, viciado, degenerado playboy de classe alta Patrick Melrose, numa adaptação para TV da série de romances de alta octanagem escrita por Edward St Aubyn. “Eu encaixei bastante vida nesse período, você está certo. Quem diria?”, ele diz. “É extraordinário. Eu tenho sido um homem de muita sorte. Eu tenho muitas pessoas para agradecer, porque tem sido ótimo. Realmente”.
Mas não é só uma questão de sorte, certo, Benedict? Você tem permissão para pegar um pouco do crédito. “Claro. Claro, é preciso de muito trabalho duro e tudo isso é resultado de alguma coisa, mas eu frequentemente paro para absorver tudo isso e fico: ‘Como? Por quê?’. É extraordinário que todas essas coisas continuem acontecendo comigo”, ele algaravia. “E, sim, faz com que eu me lembre, com cada passo, do quão sortudo eu sou”.
Visitar a Comic Con no passado, onde ele deu milhares de autógrafos e posou para fotos com fãs dedicados, foi, segundo ele, um lembrete do quão longe ele chegou.
“As pessoas se vestem de todo tipo de coisa. Há muito Star Trek e Strange e Sherlock, claro”, diz o ator de 41 anos, que recentemente defendeu o dedicado fandom, descrevendo os comentários de sua coestrela Martin Freeman sobre os fãs tirarem a graça da série como “patéticos”.
“O que eu amo em relação ao meu trabalho é que eu não tenho que ficar parado num papel por muito tempo. Mas aí você coloca seu braço em volta de uma pessoa ao posar para uma foto e ela fala: ‘Eu o amei demais em Stuart: Uma Vida Revista’. Isso é maravilhoso. Há uma grande quantidade de emoções vinculadas a tantos desses papéis para mim e eu sou bem sentimental em relação a alguns deles”.
Mas qual será seu próximo passo? Bom, tendo lançado uma produtora, SunnyMarch, o cérebro por trás do telefilme The Child in Time da BBC One exibido em setembro do ano passado, Cumberbatch está com o controle total de seu próprio destino artístico pela primeira vez.
Até agora, a maioria dos filmes e séries que a SunnyMarch anunciou será estrelada por Cumberbatch. Mas como é estar envolvido no processo criativo que vai das páginas às telas, usando seu poder de estrela para moldar a cultura?
“Meu Deus, isso soa terrível”, ele diz. “Como se eu estivesse decidindo as séries ou filmes que vocês assistem”.
Bom, a seguir, ele estará nos fazendo assistir à Patrick Melrose, que explora questões envolvendo classe, vício, abuso e sobrevivência. É medo e repugnância num cenário aristocrático – e Cumberbatch é perfeito para o papel. Ele explica que a série oferece um “post-mortem aguçado de um sistema elitista que está desmoronando”.
E Melrose, quem Cumberbatch interpretará desde o começo de sua vida adulta, no primeiro episódio, até seus quarenta e poucos anos, no último episódio?
“Ele é viciado em drogas e quase suicida, mas também é incrivelmente engraçado e brilhante”, ele diz.
Para o papel, ele passou um tempo com o 3D Research Bureau, localizado em Liverpool, para aprender mais sobre vício e abuso.
“O mais importante foi a motivação por trás do apetite, do vício, a necessidade psicológica que essas drogas destrutivas criam”, ele explica. “O que elas estão substituindo? No caso da heroína, basicamente todo mundo com quem eu conversei disse que tem a ver com o abraço caloroso que nunca recebeu da mãe. Um alívio para o sofrimento da existência. O tipo de pessoa que luta contra o vício, o tipo de pessoa que vivenciou abuso, tristemente aparece em todas as classes sociais, então existe uma universalidade em relação a isso que eu acho que será traduzida na tela”.
Não é só sobre dinheiro e devassidão e dano e destruição, diz Cumberbatch (apesar de que alguns poderão discordar disso após assistirem ao primeiro episódio). “Esta história é sobre como o amor é a verdadeira fortuna, e como um amor verdadeiro, puro, bom e inocente pode vencer. Mas, nossa, como ele luta para chegar lá”.
O ator lista Big Little Lies e Twin Peaks entre seus próprios destaques recentes da televisão, além de Al Pacino em Os Viciados, que ele assistiu como parte da música ambiente para Melrose.
Mas é o papel como produtor executivo que capturou sua imaginação tanto quanto as brincadeiras na tela.
“Tem sido uma grande curva de aprendizado, e uma experiência muito feliz para todos os envolvidos. Funcionou mesmo. Isso é mesmo um negócio de pessoas e se você acerta essa alquimia, e escolhe uma equipe boa, diligente, desafiadora e gentil, você cria um ambiente de trabalho muito bom, o que é muito produtivo”, ele diz.
“O que é empolgante pe a chance de ser criativo de diferentes maneiras. Nós estamos fazendo o tipo de conteúdo que eu gostaria de ver e do qual estou orgulhoso — isso é realmente emocionante”.
Ele fala longamente de querer que sua companhia trabalhe diferentemente. Que crie um ambiente criativo positivo e feliz. Sem mencionar nomes, ele fala de produções nas quais trabalhou que ele teme tenham sido um pesadelo para alguns membros da equipe. Cumberbatch volta repetidamente para a palavra “gentileza”.
“Como uma cultura e como uma cidade nós tivemos uma época muito contundente”, ele diz, quando pressionado sobre por que gentileza é tão importante agora.
“Mas a coisa que triunfou sobre toda a atrocidade, quer seja o horror da [torre] Grenfell ou os ataques [de terror] é a gentileza. O heroísmo e a gentileza extraordinários, as histórias onde você ouve da natureza humana prevalecendo. E você tem que se segurar nisso em tempos sombrios e difíceis.
“E mesmo antes disso, foi algo que eu queria estabelecer como um ethos em geral. Da minha experiência, coisas muito boas vêm disso. Estamos fazendo entretenimento. É claro que pode ser educacional ou socialmente motivado fazer a mudança mas você tem que ir nisso gostando. Um bom trabalho feito sob condições horríveis ainda é um bom trabalho. Mas você não consegue muita fidelização de clientes e azeda para aqueles que são parte disso.
“É descaradamente possível fazer um bom trabalho e se divertir. Então por que não nutrir esse ethos?”
Se a SunnyMarch é fundada em gentileza, parece importante pressionar Cumberbatch sobre o comprometimento dela à diversidade e representação. Não menos importante porque o ator veio a ser o garoto-propaganda da onde de astros britânicos educados privadamente tomando conta da indústria de atuação cada vez mais global.
Ele se certificará que a diversidade e representação na tela e fora dela estejam no primeiro plano de seu trabalho como produtor?
“Absolutamente”, ele diz rapidamente. “Uma das nossas missões é criar posições muito mais importantes, desafiadores e interessantes para mulheres na nossa indústria.
“Estamos fazendo isso com como contratamos funcionários para nossa companhia assim como qual foco temos no nosso trabalho. Estou muito ciente de dizer tudo isso, mas no momento é o velho e chato eu branco, homem, de escola pública, como-quer-que-você-queira-me-chamar começando isso — porque eu posso trazer dinheiro e atenção a projetos.
“Mas nossa companhia também está estabelecendo suas próprias credenciais da qualidade daquele trabalho e como isso se concretiza”, ele continua. “E é quando podemos zarpar com alguns desses objetivos, que inclui diversidade de maneira geral — de gênero, racial, orientação sexual”.
Uma vez que a SunnyMarch for uma parte estabelecida da indústria da cultura, o que podemos esperar?
“Todo tipo de contador de histórias contanto todo tipo de histórias”, ele diz. “Não vamos fazer drama simples e sem imaginação. Vamos fazer tudo na-sua-cara”.
Ele não deixa isso assim. É um assunto no qual ele pensou muito e bem. E ele parece às dores para se explicar e não deixa nenhuma possibilidade de ser mal entendido ou citado erradamente — particularmente em face das críticas em mais de uma ocasião, tanto por seu papel em projetos que são esmagadoramente masculinos e pálidos, ou por concordar em interpretar um boxeador sem luvas romani em Gipsy Boy.
“O problema é que eu quero muito falar sobre isso mas não posso já que não é boa prática de produção falar sobre projetos que estão em desenvolvimento — porque se por um motivo ou outro eles não sobrevivem ou funcionam, parece ar quente”, ele diz, antes de rir, e acrescentar. “O que, igualmente, eu percebo, não te dizer quais são os projetos também soa!
“É uma ótima pergunta e eu responderia com a prova da nossa lousa daqui a um ano, com o que conseguimos alcançar o que é sabido que vai à produção. Não posso. É um cavalo de troia e não é boa política”.
Com seu novo chapéu de produtor chegam novas dores de cabeça, então.
“Não é apenas spoilers de roteiro como um ator”, ele diz. “Como um produtor, você nem pode falar sobre projetos. Mas existem coisas boas acontecendo.
“Haverá outras vezes quando essa conversa pode ser tida e apoiada com fatos concretos ao invés de apenas boas intenções.
“Olha, eu comecei isso por causa de certos momentos que ficarão sem nome quando eu pensei, ‘Deus, acho que isso pode ser melhor para a equipe’. Acho que pessoas devem querer mesmo fazer este trabalho, não só ter isso no currículo delas mas também porque eles farão um bom trabalho e terão uma boa memória do trabalho — não apenas horas de tortura quando eles não conseguem ver família delas”.
Patrick Melrose começa em 13 de maio, às 21h, no Sky Atlantic e Now TV.
Tradução: Gi e Aline
Antes do scans, achamos importante mencionar que a The Big Issue também é uma caridade, cuja missão é ajudar pessoas em situações de pobreza. A revista é vendida nas ruas, sendo que seus vendedores a compram por £1.25 e a revendem para o público por £2.50.
Por isso mesmo é que só estamos postando a tradução e os scans da entrevista agora que ela já pode ser lida na íntegra no site da revista. Contudo, quem quiser e puder comprar sua edição digital, disponível no Brasil através do Zinio, ainda estará contribuindo, já que, segundo eles:
Estamos usando o Zinio digital editions a fim de criar oportunidades de renda adicional para financiar nossos serviços de proteção aos nossos vendedores na rua e no campo. Somos um empreendimento social e todas as nossas verbas são usadas para ajudar as comunidades vulneráveis que nós servimos.